Desmamar falando para o seu filho que o mamá esta dodói é uma forma complicada de desmame porque faz a criança sentir-se culpada. E não é isso que queremos. O momento de desmamar precisa ser um final de história digno e tranquilo para a criança. Onde ela se despede da mama materna com alegria e não com culpa. Veja abaixo o que diz a Luzinete R. C. Carvalho – Psicanalista
“Muitos acreditam que há um problema em se falar sobre desmame. Isto está bem longe da verdade, eu mesma não tenho nenhum problema em falar sobre desmame. Apenas gosto de deixar vários aspectos claros antes de mergulhar neste ponto específico. Gosto de tratar o assunto com o cuidado e a profundidade que ele merece. Já que há tanto envolvido, falar sobre desmamar não se pode ser superficial. Não dá para ser simplista. É preciso entender que desmame e amamentação não são assuntos separados, não são coisas diferentes.
Desmame é uma parte do processo, é uma parte da história, é a parte final da história de amamentação! E acredito que quanto mais falarmos sobre desmame melhor será, pois iremos compreender cada vez mais sobre tudo que envolve a amamentação, inclusive sua fase final que é o desmame.
A amamentação deve ser exclusiva até os 6 meses e continuada por até dois anos ou mais. (veja aqui: Aleitamento materno exclusivo: o que isso realmente significa?) Existem muitos estudos que comprovam os benefícios da amamentação por vários anos, existem estudos sérios que comprovam que o leite materno não “vira água” após 1 ou 2 anos, na verdade, o leite materno continua sendo rica fonte de nutrientes e anticorpos por todo o tempo que durar a amamentação. (veja aqui: Até quando o leite materno tem nutrientes?)
Vale lembrar que o desmame natural existe, um desmame em que mesmo sem sofrer interferências, mesmo sem sofrer reprimendas e sem ter seu acesso ao peito negado, a criança vai diminuindo as mamadas aos poucos, até que deixa de mamar definitivamente. A criança vai encontrando, com a ajuda da mãe, outros meios de se sentir consolada, protegida e segura, vai encontrando outros meios se conectar com a mãe, substituindo cada vez mais o peito por abraços, carinhos, beijos, brincadeiras, danças, palavras, etc.
O leite materno continua sendo o principal alimento do bebê até pelo menos 12 meses, e é fato que algumas vezes os bebês realmente gostam de mamar mais do que gostam de comer, mas é falsa a idéia de que passam fome porque “só” mamam. Aos poucos, conforme vão conhecendo outros alimentos, de preferência saudáveis, frescos e livres de industrializados, eles vão se interessando por outras fontes de nutrição além do peito. E podem continuar sendo amamentados sem nenhum problema, na verdade, obtendo muitos benefícios físicos e emocionais. (veja aqui: Leite materno não é um vilão na amamentação.)
Enfim, tudo isso é necessário falar antes de entrarmos, de fato, no que é ideal ao desmamar uma criança. Depois de ter realmente avaliado suas verdadeiras razões, se a mãe decide desmamar seu filho, se ela, por suas razões, não quiser esperar pelo desmame natural, ela deve conduzir o desmame de forma gradual, respeitando o tempo da criança, nunca abrupto, negando ou criando artimanhas e estratégias para manter o peito inacessível. Mas eis que entre os piores métodos que se usa para desmamar uma criança, está a técnica do “mamá dodói”.
Quem nunca ouviu falar de alguém que desmamou um bebê dizendo que o mamá estava dodói, machucado ou doente?
E que para tornar mais convincente a estratégia, usou de curativos, faixas, band-aids, tintas vermelhas simulando sangue, pequenas encenações de dor? Eu levo em conta os vários casos de gente que usou desta “técnica” e diz que o filho não ficou traumatizado, mas alerto que o trauma advindo deste tipo de desmame poderá refletir na vida adulta! Pensar que o peito é limitado a alimentação física é desconsiderar muitas coisas relacionadas a amamentação.
Pode-se trocar o leite pelo suco, por leite de vaca, ou por qualquer outro alimento, mas o peito também é a sensação de segurança, afeto, aconchego e prazer, e isso não pode ser simplesmente ignorado ou retirado abruptamente. Existem pessoas que não se acham merecedoras de coisas boas, ou estão sempre temerosas de que quando algo bom acontece logo algo ruim também acontecerá, pessoas que não creem que aquilo que acontece é bom “de verdade”, nunca conseguem simplesmente desfrutar das boas coisas.
Pessoas que não conseguem sentir prazer sem sentir medo! Estão sempre desconfiadas e/ou com medo. A ansiedade está sempre presente. Pessoas assim acabam deixando passar oportunidades, não conseguem se entregar verdadeiramente em um relacionamento, não conseguem manter a mente positiva.
Não conseguem desfrutar da alegria por medo de que algo ruim aconteça. Pessoas que não lidam de forma positiva com o prazer. Pessoas que se encaixam neste perfil podem ter em comum que foram desmamadas através da história do “mamá doente”, do “mamá machucado”. Pessoas que quando bebês/crianças tiveram o peito, que era fonte de alegria, prazer e carinho, tirado e transformado em fonte de doença, ferimento, coisa ruim! Colocar band-aid, esparadrapo, passar remédio no peito, ou pior: deixar a criança provar do peito com alguma substância de gosto ruim, pode causar tudo isso no futuro!
Claro que não se pode afirmar que todos que passaram por um desmame através desta técnica sofreram ou sofrerão danos, existem muitas variáveis que podem interferir, a vida é composta de muitos outros acontecimentos e cada um vai lidar com as experiências que teve de um modo muito particular. Para alguns, isso nem contará como parte das lembranças, ou realmente não interferirá de modo algum em sua vida. Mas podemos afirmar que é um risco.
Se não se convencer pelas hipóteses de prováveis futuros problemas, se não quiser ouvir falar em danos psicológicos, se quiser ignorar os riscos, este é um direito seu que eu compreendo. Para algumas pessoas tomar decisões baseadas em possibilidades é algo impraticável. Para algumas pessoas, decidir algo hoje pensando no que pode acontecer daqui 20 ou 30 anos pode soar absurdo, e eu realmente compreendo isso.
Portanto, se esta linha de “prevenir algo incerto” não lhe agrada, sugiro que a gente use uma outra linha de raciocínio para entender as razões para esta técnica não ser adequada, pense apenas nos fatos: podemos afirmar que dizer que o peito está dodói e usar de artimanhas e encenações para convencer a criança de que isso está acontecendo é uma MENTIRA.
E certamente não é este o tipo de relação que você quer criar com seu filho, não é mesmo? Sem falar que é privar de uma hora para outra, o acesso da criança a algo que é importante para ela. Para isso basta que pense em algo que goste, que lhe seja muito importante, e que esteja habituado a ter, e imaginar como seria se lhe tirassem isso de uma hora para a outra, por conta de um problema sério que nada tem a ver com você.
É sem dúvidas, causar sofrimento, ansiedade, preocupações (que não são por um motivo real) e tristeza para a criança. Preciso ressaltar que o uso desta técnica não tem nada a ver com a mãe avisar o bebê ou criança que o jeito dela mamar pode estar machucando seu seio. São coisas absolutamente diferentes.
Levando em conta que a amamentação é uma relação íntima e profunda entre mãe e filho, tudo que diz respeito a esta relação deve ser comunicado ao bebê/criança, obviamente levando em conta o grau de entendimento da criança e a linguagem usada para que ela possa compreender.
Se o bebê ou criança está mamando de um jeito que causa dor, que machuca, que causa desconforto para a mãe, ela precisa ser ajudada a compreender isso. A criança precisa ser ajudada a aprender a mamar com cuidado, com carinho, sem gestos que causem dor ou incômodo. É preciso que a criança seja avisada e ensinada a como cuidar do mamá. Justamente para que a amamentação seja saudável e alegre para os principais envolvidos.
A amamentação é um forte elo, uma das (muitas) maneiras de criar um vínculo poderoso entre mãe e filho, e justamente por isso, a amamentação deve ser sempre fonte de aprendizagem e crescimento para ambos. O momento de desmamar seu filho precisa ser respeitoso.
Poder conversar de forma clara e sincera é estabelecer bases sólidas para o diálogo, e construir uma relação de confiança que existirá para sempre entre mãe e filho. E falar que determinado jeito de mamar, ou determinado gesto é incômodo ou causa dor, é falar a VERDADE, ou seja, muito distante de toda a encenação, de toda a artimanha que envolve a tal “técnica do mamá dodói”.
Desmamar com consciência, verdade e aprendizado:
Ajudar a criança a entender que precisa tomar cuidado com o peito da mãe ou até pedir para que ela mame menos, é dizer a verdade. Dizer que o leite “estragou”, que o peito está doente, e por isso a criança não poderá mais mamar, é MENTIRA.
Cedo ou tarde a criança saberá que foi enganada, que tudo que viu e ouviu sobre o mamá era uma invenção, uma maneira de enganá-la, uma grande mentira, contada principalmente por quem ela mais ama e confia. Caso já tenha usado desta técnica para tentar o desmame, se ainda houver tempo, simplesmente reconsidere e volte atras, diga que o mamá sarou, e conduza o desmame de outra maneira.
Se o desmame já é irreversível, tente focar sua relação com seu filho na verdade e sinceridade, se houver meios ou motivos aparentes, conte a verdade para ele, diga que não sabia que seria ruim fazer daquele jeito, que sente muito e que não mais vai contar mentiras para ele. Eu nunca soube de um único caso em que a amamentação por muitos anos foi um problema na vida da pessoa, mas já vi casos em que o tipo de desmame feito causou prejuízos.
Portanto, o problema nem sempre é desmamar, e sim a maneira como isto é feito.
Lembre-se, que embora raro hoje em dia, cercado de preconceitos e ignorância, o desmame natural é plenamente possível, a criança vai deixando de mamar aos poucos até que deixa definitivamente, tendo suprido todas as suas necessidades físicas e emocionais, crescendo bem resolvida, e forte emocional e psiquicamente.
Desmamar transmitindo uma relação de confiança:
O mais importante é construir uma relação de confiança com os filhos, e a amamentação pode ajudar muito nesta construção, mas é preciso que os adultos envolvidos sejam atentos, sensíveis e empáticos ao lidar com os bebês e crianças.
Confiança se constrói um pouco a cada dia, baseando a relação no carinho, no respeito e na sinceridade. Crianças compreendem muito bem aquilo que dizemos, e compreendem ainda melhor aquilo que nem falamos, por isso reflita bem antes de tomar qualquer decisão.”
Quer uma solução para desmamar de forma gentil? Veja estes artigos: